O que distingue basicamente o homem meditativo do pensador é o fato de que ele não medita a respeito de uma coisa, e sim a respeito de sua meditação sobre essa coisa. A situação do meditativo é a do homem que já encontrou a solução do grande problema, mas, em seguida,a esqueceu. E agora medita não tanto sobre a coisa, mas sobre a meditação que outrora fez sobre ela. O pensamento do homem meditativo situa-se, pois, sob o signo da recordação. O Meditativo e o alegorista são feitos da mesma matéria.
[...]A recordação do homem meditativo dispõe da massa desordenada do saber morto. Para ele, o saber humano é despedaçado em um sentido particularmente significativo: ou seja: como a quantidade de peças arbitrariamente recortadas a partir das quais se monta um quebra-cabeças. Uma época avessa à meditação conservou seu comportamento no quebra-cabeças. Este gesto é sobretudo o do alegorista. O alegorista pega uma peça aqui e ali do depósito desordenado que seu saber põe à sua disposição, coloca-a ao lado de uma outra e tenta ver se ambas combinam: aquele significado para esta imagem ou esta imagem para aquele significado. O resultado nunca pode ser previsto, pois não existe uma mediação natural entre os dois. Dá-se o mesmo com a mercadoria e o preço. As "argúcias metafísicas" nas quais se compraz a mercadoria, segundo Marx, são sobretudo as argúcias da estipulação do preço. Nunca se poderá saber ao certo por que tal mercadoria tem tal preço, nem no curso de sua fabricação, nem mais tarde quando ela se encontra no mercado. Ocorre exatamente o mesmo com o objeto em sua existência alegórica. Nenhuma fada determinou em seu nascimento qual o significado que lhe atribuirá a meditação absorta do alegorista. Porém, uma vez adquirido tal significado, este pode ser substituído por outro a qualquer momento. As modas dos significados mudam quase tão rapidamente quanto o preço das mercadorias. De fato, o significado da mercadoria é seu preço; como mercadoria, ela não possui nenhum outro significado. Por isso, o alegorista está em seu elemento com a mercadoria. Como flâneur,ele se identificou com a alma da mercadoria; como alegorista, reconhece na "etiqueta com o preço",com a qual a mercadoria entra no mercado, o objeto de sua meditação: o significado. O mundo em cuja intimidade o faz ingressar este novíssimo significado:nem por isso se tornou mais amável. Um inferno se debate na alma da mercadoria, por mais que pareça que ela tenha encontrado no preço a sua paz.